quinta-feira, 30 de julho de 2015

Como um mantra desta noite

Não esquecer dudus e carregadores. Não esquecer dudus e carregadores. Não esquecer... Vou pôr lembrete no telemóvel.
(Ainda me lembro do tempo em que estava sempre em ação para sair. Do não vai nada do que fica. Do lá também há. Do se me esqueci espero dar pela falta quando regressar. Do ir sem destino e dar por mim a mergulhar na via ceresio rendido à bresaola. Agora, esse tempo submete-se a calendários e, por vezes, é preterido. Enfim, espero não me esquecer dos dudus, que carregadores há muitos.)

É preciso ser burro e velho. A pedra de toque está no e.

Presumi que a desabituação à alavanca das mudanças demorasse mais tempo. Diria que foi intuitivo, mas não uso disso. Digo-vos antes que A Chula tem razão.
Já o raio do manípulo esquerdo acende a luz da chávena a fumegar de cada vez que quero piscar.
Claro que o tamanho importa. Os homens sabem-no. Não os burros. Mesmo os velhos. Quanto maior melhor. Por vezes. Quanto mais rápido melhor. Nem sempre. Depende. Falo de carros. Evidentemente!

quarta-feira, 29 de julho de 2015

Visão cumprida

A quarta sucedeu à segunda e soube a tempo. Enlevo-me na exploração da realidade que idealizei enquanto revivesço nos contornos mais ousados como se me desembaraçasse da sombra. Ainda que a estreia seja sempre inauguração, o desejo não é sempre sonho. Conduzo em direção à única meta que persigo: casa.
Se me apetecesse fugir de lirismo inúteis, talvez recordasse o petiz que, montado na bicicleta, descia a ladeira envolto em chiadeira e regressava a casa convicto de que todas as moças casadoiras tinham ido à janela para o ver passar.
Talvez (que é como quem diz não me apetece), talvez até dispensasse interpretações e vos mostrasse.
À chegada, empoleirada no muro, esperava-me. 
 

O Porto é uma grande nação

Quizás, quizás, quizás, Sarita aprenda aquela da agua que no has de beber.
Entretanto, bésame mucho...

terça-feira, 28 de julho de 2015

Tão amigas que elas são

Exercito o meu lado mais popular no Facebook, aceitando pedidos de amizade de amigas de amigas que nunca vi mais magras. O meu esforço, porém, é gorado. Não consigo deixar de me sentir agoniado com as fotos de férias publicadas, enquanto concluo que se lá estivesse vinha-me embora.
Além disso, ofendem-me as carpideiras do costume que se desdobram em comentários ao nível de "tás top", tão mais entusiásticos quanto mais desagradável à vista a outra estiver na infeliz foto que não soube apagar e, por lapso, partilhou.
 

segunda-feira, 27 de julho de 2015

Epitáfio das Termópilas

A segunda feira do rapto das Sabinas. Venham buscá-las. A segunda feira da cavalgada das Valquírias. Frankly my dear I don't give a damn. A segunda feira de Alcácer Quibir. O que os Medos mataram. A segunda feira dos concertos de Rameau. Há quem goste de se sentar no cais e quem precise de mergulhar na maré. A segunda feira da luta de Titãs. Combateremos à sombra. A segunda feira do instinto migrante. I'm a rambling man. A segunda feira da nuit chez Maud. Indício de desdém. A segunda feira em que nada será como antes. Ainda não foi desta...

domingo, 26 de julho de 2015

Às vezes, parece-me sorte a mais

Que acordem quando querem. Que haja ovo mexido para ele e estrelado para ela. Que a bola de Berlim seja diária e da triunfo, que eles gostam mais. Que vão de carro para a praia, porque naquela podem jogar à bola. Que o banho antes de jantar seja de imersão. E que tomem duche antes do almoço, porque o sal pode incomodá-los. Que os gelados sejam a Lagardère e haja cornettos para ele e Häagen-Dazs para ela. Que a fruta seja servida descascada. Que as batatas sejam às rodelas. Que as sestas sejam à vontade do freguês e se não queres dormir o avô joga contigo à batalha naval. Que as estórias sejam a dobrar e haja pijama party todas as noites. Que a avó empreste os lenços para turbantes e o avô ensine a fazer tendas com lençóis no meio da sala. Que o estrado da praia seja a passerelle dela, enquanto me apresso a bloquear imagens mentais que associo à palavra. Que o avô os leve à quinta da Andrea porque eles têm saudades dos cavalos. Que o suminho seja acabado de espremer. Que alternem entre o pequeno mundo e a casavostra para satisfazer ambos. Que os dias com os avós sejam do melhor...
Agora, que me entrem no carro a pedir para pôr na rádio dos avós por causa da música "somos os tais"...   

sexta-feira, 24 de julho de 2015

Um post triste

Enfim chega da noite o triste espanto,
Mochos de voz triste e lamentosa.
Um sino dobra em mim Ave-Maria
E a noite é triste como a Extrema-Unção.


O dia deu em chuvoso,
Impeçam o cão de latir.
O que foi não é nada e lembrar é não ver
Porque pensar é não compreender.


Começa um rio numa gota de água,
Não deve ser de propósito que os dias correm.
Falta queimar a inspiração!


É esperar por D. Sebastião...



quinta-feira, 23 de julho de 2015

Não contem comigo para posts "fofinhos"


Da maioridade nisto dos blogs

Decorridos mais de trinta anos em idade de blogs, envolvido pelo fumo deste Cohiba Behike que acompanho com o fiel Henessy Paradis, concluo que os meus melhores posts não são os mais lidos; que os (as?) anónimos preferem quando dou rédea solta à arrogância, para logo darem voz à censura; que não filosofei tanto quanto pensei, nem escrevi sobre viagens tanto quanto queria; que as visitas diárias se contam em centenas e por vezes não chegam; que continuo a gostar de comentar blogs bons; que o jogo é a diversão e sempre gostei de brincar com quem sabe; que se fosse para escrever para mim teria pegado num diário; que escrevo por mim; que a moda do "isto não são só blogs" também passará; que os blogs mais populares não são os melhores e o Velho* já o sabia; que me perdoam os posts insolentes e alguns até já reconhecem a provocação propositada; que ainda não acabei. A ver vamos, se Mann tinha razão.
... e que gosto dos que têm opinião e não têm pejo em dizê-la. Mas isto, eu já sabia.

*Pieter Bruegel, A Parábola dos Cegos

quarta-feira, 22 de julho de 2015

Temoneira dos meus sonhos

Os teus lábios têm asas que me procuram etéreo. Descubro, no sono que nos demora, o desejo nihilista de nunca chegar. Cristalizo-me no crepúsculo do meio dos teus dias. Avanço iluminado pela tua sombra e vou desvendando a profundidade da ternura na carícia das raízes nascidas sob a espuma. Fundo-me com o êxtase da madrugada que dança entre nós.
Acordo amanhã. De mãos abertas.
Ontem, ensurdeci para as metáforas sem casa das palavras enigmáticas com significados sinistros.
Hoje...



A visão é sobrevalorizada

Para saber quais os nichos com máquinas de café onde se concentram duas ou mais mulheres basta ouvir.

terça-feira, 21 de julho de 2015

Sem lugar para reclamações

No âmbito deste ciclo blogo-histórico, assistimos a uma tentativa ministerial (apud banco central) de tocar todos os burros, num esforço para impor uma ordem de selos-aviso.
Caros todos, só obteremos aquele qualquer coisa por que ansiamos se não abdicarmos do "dever ser" de um blog, que deverá ser procurado a Oriente do Oriente do Oriente, sem qualquer ponto final na divagação do blogger.
Neste blog, a fundamentação em termos argumentativo-concludentes supera a demonstração apodítica. Até porque, a humanidade deste Outro passa por eliminar erros seus de amor ardente e não por aceder à verdade, sem contudo pretender falsificar os portos onde se vai abrigando.
Esta instabilidade bloguística que nos integra, nos situa, nos relaciona, nos põe em correspondência uns com os outros, vai-se reconstruindo, tal como nós, a cada post.
Daí que me oponha a todas as leis que pretendam prender o instável. Recuso as normas de imanência intencional heterónoma que não devêm da constituenda dialética tridimensional formada por post-comentário-resposta. E faço-o com todo o à-vontade, uma vez que não sou senhor de blogoeuros e donde não há não se pode tirar, que vale muito mais do que quem não deve não teme.
Ligo-me ao mundo olhando-o com apetência e sem petrificar a dialética potenciada pela emergência de comentadores descontentes numa burocracia de reclamações. Faço, porém e como me convém, uso de um critério seletivo puramente variável da minha vontade.


domingo, 19 de julho de 2015

1 pai, 2 filhos, 3 mil km

Eu quero ver tudo. Eu também não tenho sono. Olha os meus olhos. Olha o girassol, diz adeus ao sol, sorri tu também. Disseste que havia porcos pretos e só vimos vacas. O Duero é mesmo o Douro? Muitos túneis. Gosto das torres. Sarapico, pico, pico. Tanto amarelo. Outro cemitério de camiões. O clavelitos é espanhol? Canta lá. Que passeios grandes. Pensava que era um urso de flores, mas agora parece um gato. Quero o teu taco branco. Eu gosto de carregar nos números e ouvir. Acho que vais dar uma turra neste labirinto. Não gosto de ovo-tortilha. As croquetas é que são boas. Olha, pinheiros do Natal dos filmes. Está ali escrito aquilo que tu gostas: Cognac. Adivinha toleirão quantos dedos estão na mão. A casa de banho é vermelha. Vamos de autocarro? A sério? Até parece uma concertina. Nós fomos os primeiros. Nós é que éramos os do carro branco e ganhámos a corrida. O que eu gostei mais foi o dos rabbids. O do espaço foi uma seca. O meu galito é bom cantor. O óleo não saiu do dedo do pé. Vamos fazer um concurso. Eu faço as perguntas, o mano conta os pontos e tu respondes. Já beijaste alguma senhora com baton? Diz coisas tuas. Nunca mais vou dizer que a praia é longe. Minhas botas velhas cardadas. Já te contei que eu sou um girassol e tu és o meu sol...    

sábado, 18 de julho de 2015

Conjugo-te

Entro
te veo
te observo
te descifro
te espero
te hago cosquillas
te provoco
te rebusco
te respiro
hablo
sonrío
toco tu pelo
tu eres
tu eres quien me hizo esto
tu formas parte de mi
te muestro
te siento
te pregunto
me pregunto
no espero
no te preguntaré
no puedo decírtelo
miento
Mi fiebre
mi piel
no puedo respirar
no puedo tragar
no puedo andar
estoy perdiendo el tiempo
no puedo sostenerme en pie
no puedo soportarlo
Estoy llorando
había sangre
nadie me lo dijo
nadie sabía
mi madre lo sabía
olvido tu nombre
no pienso
hundo mi cabeza
hundo tu cabeza
te sepulto
lloro
clamo
muerdo
muerdo tus labios
respiro tu aliento
palpito
pido
pido a voces
te huelo en mi fiel
(Jenny Holzer)

quinta-feira, 16 de julho de 2015

Critérios de juventude

Manter este ritmo. Estar bem. Aqui tambem. Não ter pressa. Parar. Retomar. Saborear. Continuar.

segunda-feira, 13 de julho de 2015

É torcer para que não haja gatos do outro lado


Encontrei-o antes de abrir os cães. Tentei protegê-lo colocando-o do lado de fora dos muros. Um salvamento a pensar na cronista da lua.

O silêncio das mulheres de Trácia

Questiono-me se as mulheres saberão o que fazem quando olham assim. Depois, mordem o lábio inferior e as dúvidas dissipam-se.



sábado, 11 de julho de 2015

O "sossego" sem sair de casa

Não há água quente?! Não me digam que os tipos ontem deixaram a placa ligada e o termoacumulador desligado. Quem diz que no mar também se toma banho de água fria devia era. Ora pois então que o Sr. Dr. gosta de saber onde tem as coisas. Tenho taças-cogumelo. Quanto mais arrumo mais nasce para arrumar. Quantos copos é preciso ter? Para que serve isto? Olha, tenho uma coisa destas. O Dr. não sei, mas o Senhor eu antes queria abrir o raio das portas todas à procura do saca-rolhas. Pois tome lá D. H., aqui tem os tachos e as tampas despejados na gaveta, que ela fecha mesmo assim e eu estou farto. Vá lá, não me deixes. A I. vem amanhã e a relva tem de estar cortada. Uma inclinação de focinho no ar, ganhar velocidade sem tocar o chão, assim. Hara. Hara, és mesmo cagona. Agora tenho de a desligar antes de acabar. Casota. Tu também, Milu. Deixa ver o focinho. Outra vez? Ainda tenho de te dar banho. Água quente. Até me sinto menos cansado. Amanhã, será  só juntar um copo de arroz ao caldo que está no frigorífico, dispô-lo sobre o pato que a D. H. deixou no outro tupperware, e levar ao forno. Et voilá, arroz de pato. Feito por mim. As mulheres adoram homens que sabem cozinhar...         

sexta-feira, 10 de julho de 2015

Canção à lua para um fim de semana sossegado

O livro do stress não seria tão poético...



Mulheres, quotas, coutadas e cotadas

Há dias, enquanto passava os olhos pelas gordas dos jornais, deparei-me com um cabeçalho que falava em "mulheres nas cotadas". Assim, de repente, aquela "leitura na diagonal" remeteu-me para a "coutada do macho ibérico". O célebre Acórdão do nosso Supremo Tribunal de Justiça preconizava, há 25 anos, que as mulheres, por vezes, "estavam a pedi-las"*.
Ultrapassada que está (?) a ideia de que uma mulher de minissaia está a pedi-las, continua a haver uma cultura de ponderação de circunstâncias que, não sendo atenuantes, funcionam como se o fossem. A propósito bastará ler algumas recentes decisões dos nossos Tribunais Superiores, especialmente no âmbito da violência doméstica perpetrada contra mulheres ou dos crimes de natureza sexual**. É a cultura do "pôr-se a jeito" que ainda grassa.
Enfim, o artigo falava, afinal, da criação de quotas para mulheres nas empresas cotadas em bolsa. Ora, apesar de respeitar e ter até dificuldade em refutar alguns dos argumentos de quem defende que uma tal situação onerará as mulheres com um novo estereotipo: precisamente o de só ali estarem a favor; apesar de concordar com quem refere que as mulheres não precisam de favores; estou convicto de que, destas medidas, precisamos todos.


* "As duas ofendidas muito contribuíram para a sua realização. Na verdade, não podemos esquecer que as duas ofendidas, raparigas novas, mas mulheres feitas, não hesitaram em vir para a estrada pedir boleia a quem passava, em plena coutada do chamado “macho ibérico”. É impossível que não tenham previsto o risco que corriam; pois aqui, tal como no seu país natal, a atração pelo sexo oposto é um dado indesmentível e, por vezes, não é fácil dominá-la. Ora, ao meterem-se as duas num automóvel juntamente com dois rapazes, fizeram-no, a nosso ver, conscientes do perigo que corriam, até mesmo por estarem numa zona de turismo de fama internacional, onde abundam as turistas estrangeiras habitualmente com comportamento sexual muito mais liberal e descontraído do que a maioria das nativas (...) Possivelmente, outras formas haveria, contudo, de ele manter relações sexuais com uma ou até com as duas ofendidas. À força, como o fez, é que não. De qualquer maneira, a gravidade do ilícito no caso concreto está, como se disse, algo esbatida".
** Assim, o Acórdão também do STJ, de 2004, que apela ao facto de a mulher assassinada recusar manter relações sexuais com o marido-homicida, assim violando os seus "deveres conjugais".

Ambos os Acórdãos estão disponíveis na base de dados:

quarta-feira, 8 de julho de 2015

Post dos agrados

Árvores de fruto, lençóis brancos, Egon Schiele, casas com barras garridas, cidades, cheiro a eucalipto, cherchez la femme, depressa, caçar, arroz, slide, Cesare Pavese, imensidão, conversas, Hennessy Paradis, vermelho, movimento, Emmanuelle Béart, silêncio, carros, piano, dardos, Jan Garbarek.







terça-feira, 7 de julho de 2015

Amo de memória

Da terceira margem da barragem onde me encontro concebo perder-me sem partir. A deformação efabulada do promontório final confunde os mais orientados. A fachada do templo nunca foi familiar e jamais será intacta. Talvez se escore em fendas abertas pelos anos mais negros e sustente alicerces distorcidos por inamovíveis raízes.
Repouso em troncos vivos, enquanto a alucinação não se esfuma e me faz acreditar que nada nos é inaceitável. Vagueio por entre regras e evito fronteiras. Entretanto, entre nós, todas as separações são falseadas. Absurda é a imagem grotesca da desconfiança trazida pela ausência em forma de espólio indulgente.
O equívoco derroga-nos.

(Bruce Davidson)

Por um triz

A semana já se adivinhava assim. Gosto de promessas que se cumprem. Os passos de felpa das ursas dos Orsini que me descansam são os mesmos que me maçam. Rapidamente.

segunda-feira, 6 de julho de 2015

É obra que quereis?



Vouloir é um verbo que voa

Não me obrigues a parar. Se não sabes para onde vais, sabe, ao menos, para onde queres ir. Não peças autorizações indevidas nem desculpas fingidas. Não perguntes se gosto. Vem comigo. Conduzo sempre. Mesmo quando vou contigo. Ganhas sempre que me desafias. Não te queixes de falta de espaço. Não sei o que isso é. O espaço sobra-me sempre. Cabes sempre.

domingo, 5 de julho de 2015

Como se explica o instinto?

O desconhecimento aliado às boas intenções leva-nos, por vezes, a, inconscientemente, onerar os outros. Por exemplo, oferecer peixes dourados para um aquário de água quente ou um porquinho da índia doente, que acabou mesmo por ir ter com os familiares à Índia. A última destas prendas foi uma tartaruga terrestre para fazer companhia a Morla (a pequena tartaruga aquática que, há tempos, postei). Sendo, por estas bandas, os animais adotados com paixão, torna-se impossível devolvê-los por mais que nos disturbem. Daí que se tenha improvisado, ao fundo do quintal, um habitat para "Ariel", onde não faltavam uma pia enterrada e uma grade funda, que a impedia de escavar e acabar atropelada e alta para os cães não saltarem.
... Mas, Hara é excecional. Hoje, aproveitando a quietude da sesta, fez o que é: Caçou.

Foi impressionante a aflição de Hara com as lágrimas deles. Foi impressionante a confusão da cadela que fez tudo bem e, afinal, sentiu que fez mal. É impressionante como há quem nunca tenha a perceção da mágoa que causa, persistindo em fazer "tudo bem".

sábado, 4 de julho de 2015

O tamanho dos tempos

A atualização mundanal que cumpro como higiene social, ocupa-me um tempo pequeno, deixando-me, depois, livre para as páginas plácidas ou tumultuosa, mas eternas e imutáveis, onde tudo se resume com eloquente clarividência: vivemos como se soubéssemos aquilo que somos, conta Lydia Davis.

(Toni Frissell)

sexta-feira, 3 de julho de 2015

Tone Twilight Zone


A importância das coisas

Não gostas de posta mirandesa. Não ligas a política. Não vais ao futebol. Não perdes tempo a olhar a lua. Não suportas janelas abertas. Não admites cães em casa. Não concebes poesia sem rima. Não agradeces surpresas. Não ouves música sem letra. Não tens tempo para não fazer nada... Enfim, ninguém é perfeito.


O que não perdoo é que nunca jogues Sem Palavras, nunca construas com Legos, não atentes no Xadrez, esqueças as regras do Poker, recuses desenhar uma ovelha... Teria bastado a caixa.

quinta-feira, 2 de julho de 2015

Talvez amanhã

É inevitável a separação pela viagem. Vamos rompendo e recomeçando aflitos regressos. Começamos, cada vez mais cedo, os espaços interpostos por resoluções definitivas.
Dura-nos a abstinência um impaciente sossego contrariado. Retornas-me e dou tréguas à prudência. Suspendo a premeditação.


(Elliott Erwitt)

Se não responder nem se nota o pseudo


Eu sou o aerívoro da era pós-moderna hedonista antropofágica. Sou um criativo cultural inculto, tecnológico analfabeto, guru da mediocridade. Sou um impressionado que nunca se impressionou com o impressionismo. Sou da geração em 1ª classe, com o diploma do erasmo, na minha pasta de Dr.. Sou senhor do acho e vivo de citações, dentro de fatos à patrão. Sou de esquerda no coração e de direita na outra mão. Tenho costela de monárquico e ombreio com os Buiças. Li os Maias por resumo, faço relatórios por apontamentos, ouço música com phones e sou craque da wikipédia. Sou um diletante, sou um dandy, sou um empowerado, sou um chato. Sou um retórico de cashflows sem pedigree. Escolho vinhos que nunca bebi e pratos com reduzido. Tenho Gps's e i's. Viajo para Avenidas e não me perco em ruelas. Vou para dizer que fui. Não me interessa o futebol. Nunca fui a festivais. Os museus valem pelas stores. Opino sobre filmes que não vi e alardeio o Godard e a Medeia que nunca verei. Abomino a América e proclamo a potência russa. Tenho síndrome de Fabergé e nunca fui medicado. Não entro em discussões. Nunca pensei nos assuntos.
Chamam-me pseudo-intelectual e sinto-me elogiado. Havemos de nos encontrar, saine dai.


quarta-feira, 1 de julho de 2015

Subjectividade do espaço

Este tipo come de asas abertas. Ninguém lhe pôs livrinhos debaixo dos braços, em 1999. Ela está tão longe que não encostamos os joelhos nem roçamos os cotovelos. Só com os olhos lhe toco. Os olhos são alma. Quero chegar-lhe também com a pele. Movimento e matéria. Que mania esta de fazerem elevadores acatitados, em 2001. Indesejáveis vibrações omnipresentes. Apoia-te em mim. Desejo enlaçar-te e repousar a mão na tua anca. Vácuo sem gravidade. Ainda gostava de saber porque improvisam estas salas de crise e lhes dão um certo ar de bunkers. Devem pensar que se as necrópoles implodirem estaremos a salvo. Vazio ou Via Láctea. Sete palmos de terra nunca bastarão. Será tudo a perder a vista. Quero as palavras dos teus trejeitos mudos. Troco o espaço todo. Há quem se mate por um palmo de terra. Basta-me a tua sombra. Brecht e Ginsberg. Sou inquilino sem termos no nosso espaço. Sideral. Somos círculos abertos feitos de prismas inacabados. Primordiais.
(Bill Brandt)