TalqualmenteOutro
Um blogue delico-cool, onde o tal e o outro dão graças por não saberem que não sabem o que não sabem.
sexta-feira, 6 de outubro de 2017
quarta-feira, 4 de outubro de 2017
Biografia
Nasci no dia em que ela me beijou, morri no dia em que me abandonou e vivi o tempo que me amou.
terça-feira, 3 de outubro de 2017
Se o Outono fosse meu*
Se o Outono fosse meu haveria chuva e vento e névoa e monge, temperos da vida e tempos de recolhimento. Haveria vida fresca e renovada, lavouras e lareiras. Haveria dias de Golegã, excessos de maresia e de terra e de nós. Nasceriam os frutos do porvir. Haveria manhãs de luz breve, paisagens profundas, pão-de-ló e ginja, fermento e aconchego. Haveria fins de tarde na praça, regados a café e castanhas, recheados de palavras evocativas do império dentro de nós e de impropérios, embalados pelo badalar de cada minuto que passa, espreitados pelo sino da igreja matriz mais alta que as árvores altas. Haveria sombras cúmplices e serões de tréguas e regressos possíveis. Haveria noites crescentes de breu absoluto passadas em intimidades secretas. Haveria ressurgimentos breves de um Ájax menos cansado pelas coisas sérias da vida.
Se o Outono fosse meu seria como dantes. Como hoje.
Lições de estilo
Logo de manhã, o meu filho ensinou-me que já ninguém veste pólos nem leva bolas para a escola.
Escolheu uma t-shirt e pegou na batalha naval.
segunda-feira, 2 de outubro de 2017
quinta-feira, 28 de setembro de 2017
E dar banho ao cão?
Este ano lectivo, decidimos ter um "calendário partilhado" lá em casa, para tentarmos conciliar os compromissos dos três e para este pai não se esquecer de desejar boa sorte no dia da apresentação do trabalho de EV.
(O início de ano tem sido avassalador e esta seria a forma de organizar os dias, deixando tempo livre para aquilo a que o tempo não pode faltar.)
Imprimimos uma folha para cada mês e combinámos que a minha filha preencheria com caneta rosa, o meu filho a azul e eu a preto.
Quando, por fim, chegou a minha vez, poucos dias restavam em branco, no meio dos testes, das provas, dos jogos, das festas de anos, das audições, dos magustos, dos espectáculos já com bilhete, das viagens já marcadas, dos fins de semana da Golegã...
Ainda assim, os almoços em família caberão sempre, com mais ou menos ajustes. Os jogos no estádio acabarão por se encaixar. Os fins de semana na quinta e os dias na herdade, impor-se-ão a quase tudo. As consultas necessárias não permitirão concessões. Os amigos encontrar-nos-ão disponíveis.
Mas, quando cortarei a relva?
terça-feira, 26 de setembro de 2017
Ainda não foi desta
Ainda não foi desta que fui ao Estádio da Luz e não me emocionei, e não me senti importante quando o ecrã mostrou que estávamos ali 47309 pessoas e não pensei que se não fosse eu estariam apenas 47308. Ainda não foi desta que preferi o palato extravagante do snobismo à posta à mirandesa. Ainda não foi desta que reduzi os compromissos, e não dei por mim numa reunião, já passava das 23:00, a achar que se calhar estava a fazer falta noutro lado e não equacionei quantas vezes se teria levantado o meu filho até adormecer. Ainda não desta que sonhei ser astronauta, que deixei de nadar quando penso em voar, que consegui conjugar aventureiro sem ser com marinheiro. Ainda não foi desta que me afundei sem batiscafo. Ainda não foi desta que te encantei com os cacilheiros, com os versos dos outros, com os alicerces de poemas meus. Ainda não foi desta que me cansei de ser eu.
segunda-feira, 25 de setembro de 2017
sexta-feira, 22 de setembro de 2017
Resposta a uma provocação
Naquele tempo, os sons gastos saíam de dedos novos e soavam em acordes de encantos e em métricas evolutivas, regados a traçadinha e embrulhados em capas pretas. Estávamos numa das mesas de canto do Pratas e entoávamos "Só o meu é tão velhinho/Inda se não foi embora" quando a vi entrar, caloira de tranças pretas e nariz no ar. Lembro-me da graça com alinhou numa brincadeira de praxe trazendo-nos os jarros à mesa. Ela tinha traços sugestivos e uma sensibilidade evocativa. Tinha uma voz meiga e um olhar tão doce que é difícil explicar. Guardo dela a memória de um puro e genuíno acreditar, de um sonho convertido em sirene na tempestade.
Juntos, descobrimos estímulos que não sabíamos; partilhámos a tranquilidade do pôr-do-sol do outro lado do rio e demorámo-nos em locais de sonho de vida inteira. O normativo previsível da harmonia era reconfortante e desconcertante.
Ela era o meu planeta pessoal, desejado, despovoado, sereno e inteiro. Um santuário de indulgências concedidas, onde me lia páginas finais de contos onde cabiam os dias todos. Tinha o humor exótico das charadas de quem se alimenta de dúvidas.
Vivemos uma felicidade sem adorno. Partilhámos um grau decente de demência. Satisfizemos fantasias, necessidades de improviso, sedes de absoluto. Falámos dos sons, do infinito, do bem, do rio, da nudez, da volúpia, das lágrimas, das estrelas, do cansaço, da verdade, do medo, do desejo, da culpa, dos beijos, da escuridão do quarto, da cor dos olhos.
Queríamos tudo sem saber nada do que procurávamos.
Queríamos tudo sem saber nada do que procurávamos.
Então, eu era "deveras romântico" e ligava-lhe de um Motorola para um Mimo azul, só para lhe dizer que a amava.
quinta-feira, 21 de setembro de 2017
Coisas em que falhei na vida
Nunca dei seguimento a uma corrente do Facebook. Não encontrei o homem proverbial. Nunca estendi uma máquina de roupa. Nunca sonhei um sonho por que trocasse a vida que vivo. Não sei andar de patins. Não passei do meio de Em busca do tempo perdido e não ultrapassei o meu desgosto por histórias por contar. Nunca tive um porquinho mealheiro. Nunca afaguei o gato Barbieri. Nunca pretendi encher momentos de nada. Não consigo escolher entre Solitude de Billie Holliday ou É com esse que eu vou de Elis Regina. Nunca te convidei para dançar. Nunca pertenci a uma trupe de saltimbancos. Nunca quis perdoar. Nunca consegui dizer "Je suis desolée" sem me rir. Não conquistei o Prelúdio 1 de Gershwin. Nunca tentei deixar de fumar. Não tenho desejo de agradar nem pressa em chegar. Nunca me evadi das prisões que escolhi. Nunca gostei de tremoços nem de sushi. Nunca aprendia a deixar de querer tudo de uma vez. Nem a deixar de querer como quero. Nunca preferi a reputação ao ego. Nunca deixei de amar os teus defeitos.
quarta-feira, 20 de setembro de 2017
Drs e cães
O jovem dr. empregou-se na capital e por lá arranjou poiso. Coisa acatitada, que lhe não permitia albergar o seu canídeo.
Uns dias depois, acercando-se do Ti Joaquim - homem bonacheirão da terra - o sr. Fausto pediu-lhe que acolhesse o cão de seu filho, até que este tivesse condições para o levar. Por pouco tempo e com pouca maçada, evidentemente, que o dr. haveria de lhe deixar ração suficiente e de o recompensar pelo incómodo. Seria um favor de amigo. Só não ficava com o cãozito ele próprio, porque a mulher, coitada, sofria de alergias.
No fim de semana seguinte, chegou o dr., que deixou o cão e levou a trela.
O Ti Joaquim limpou o despovoado galinheiro e nele instalou o cão que alimentava com os restos de comida que trazia do restaurante de borda de estrada, onde servia às mesas. O dr. vinha passear o cão todos sábados à tarde, trazendo sempre consigo - apenas e só - a trela.
Sucedeu que o cão aprendeu a saltar a cerca que delimitava o espaço outrora ocupado pelas galinhas, a roer os vasos das flores, a esburacar a horta, a roubar as uvas e, finalmente, a saltar os muros do quintal para a estrada. O dr. só conseguia vir de 15 em 15 dias.
O Ti Joaquim prendeu, então, uma trela à coleira do cão. Suficientemente grande para lhe permitir passear-se pela capoeira e suficientemente pequena que para que não pudesse saltar a cerca.
Chegou o dr. com a trela. Foi-se o dr. com a trela. Regressou o dr., pouco depois, sem trela, mas com a guarda. Foi-se o dr., com a guarda, mas sem o cão.
Dias depois, o Ti Joaquim foi constituído arguido em processo crime, acusado de maus tratos a animais. O cão
terça-feira, 19 de setembro de 2017
segunda-feira, 18 de setembro de 2017
Crónica de impropérios adiados
Sábado, ao final da tarde, desci à garrafeira para escolher o vinho a servir.
O J. Vaz, meu amigo desde os tempos que a memória residente recorda, haveria de chegar para jantar. E, com ele, traria invariavelmente, uma garrafa de vinho do Alentejo. (Abro aqui um parêntesis para vos confidenciar que o J. Vaz, aparvalhadamente, prefere os vinhos do Alentejo aos do Douro.) Tão certo ele trazer um tinto alentejano, como eu levar-lhe um do Douro.
Enquanto me decidia entre Duas Quintas ou Quinta do Crasto, dei-me conta de que a Herdade do Rocim ganhava na proporção de 3 para 1.
Transtornado, vacilei. A predominância era-me amarga e inadmissível! Resolutamente, decidi repor o equilíbrio; restaurar as minhas preferências ao seu lugar de direito; superar os adversários, inclusive em número; e, pelo menos na minha garrafeira, conceder vitória aos do meu coração (não, isto não é um post sobre o meu Benfica).
Durante o jantar, brindámos aos dias decrescentes com um Herdade dos Grous.
No more sad songs
Depois de meses sem conseguir responder aos vossos comentários aqui no blog - o que, pessoalmente, lhe retirou apelo - eis que tudo se recompôs.
Diz-me Tal Qual que foi necessário instalar um novo browser e não explica o que aconteceu para me ser possível publicar mensagens novas e comentar em outros blogs, mas não no meu.
Enfim, está ultrapassada a situação.
sexta-feira, 15 de setembro de 2017
Quando os quarenta são os novos cinquentas
Neste início de ano letivo, ao chegar a casa da escola, diz a minha filha com a solene convicção própria dos seus 12 anos: -"Este ano, a minha disciplina preferida vai ser francês!"
Sendo o primeiro ano em que vai ter aulas de francês, perguntei-lhe o porquê de tanta certeza. Ao que me respondeu: -"Porque o meu professor é liiiiindo!"
Não achando graça nenhuma ao motivo - e, reconheço, perdendo um pouco o à-vontade -, questionei: -"Que idade tem o teu professor?"
-"Ora, pai, todos os meus professores têm mais de 50 anos!"
...e foi então que engoli em seco. É que eu fui colega de carteira do professor de biologia.
segunda-feira, 4 de setembro de 2017
Ainda não foi desta que acabei um jogo de monopólio
Catedrais de espanto. Cidades vibrantes. Águas por mapear. Pete Seeger. Paisagens que da beleza são modelo e espelho. Madrugadas em galopes de alazão. Cartas de Gorki. Proverbial tolerância e desconcertante pachorra. Prazeres efémeros. Serge Reggiani. Lugares de sempre. Ferrat. Poemas eternos. Bartoli. Montes de silêncio. Ravel. Acordes dissonantes em pretas e brancas. Paz dos dias. Tempos saborosos. Segredos de hinos. Crinas ao vento. Gemidos de dor. De prazer. La Boheme. Pedra que é degrau. Lluis Llach. Fragas de contemplação. Horas por contar em lendas contadas a idades de generoso acreditar. Escolhas bramantes. Gilbert Bécaud. Interesses provisórios. Volúpia. Deslumbres do quotidiano.
Se me apetecesse escrever sobre as férias...
sexta-feira, 30 de junho de 2017
quarta-feira, 28 de junho de 2017
terça-feira, 27 de junho de 2017
O enigma dos blogs
Sento-me a ler os blogs da minha esplanada e dou por mim a adivinhar desconhecidos.
Reconheço o ornitólogo pelo café frio que trina, o senhor da agência funerária pelos textos monocórdicos, o contabilista pelos posts curtos, o bancário pela prosa preocupada e o banqueiro pelos temas gaiteiros. Os professores são ainda mais fáceis de distinguir: no seu estendal cabem alunos e avaliações e pouco mais. Os informáticos adoptam o casual friday e o acordo ortográfico abreviado. Os cientistas calçam um sapato castanho e outro roxo. Os arquitetos têm um blog polido e os médicos, um limpinho. Os engenheiros costumam comentar-se, tratando-se mutuamente por "sr. eng.", apesar de se conhecerem desde o bibe amarelo. Os srs. drs. escolhem palavras caras sobre as últimas leituras e os políticos beijam bochechas "à" anos.
Porém, nesta esplanada, o que me atrai não é tirar a pinta pela carga de quem escreve. O que verdadeiramente me agrada é adivinhar almas...
O que haverá na gaveta da mesa de cabeceira da mãe extremosa? O que faz miss b. à noite? Quanto é preciso provocar a dama para sentir a sua garra? Com que sonha a b.? O que dirá o papelito quase desfeito que madame guarda no seu bloco de notas? Porque precisará o s. de capas falsas para o livro que lê no metro? O que levará y. a desperdiçar desejos? A aprumada muda os lençóis após uma noite? O k. guarda os bilhetes depois de os alardear? O que levou a doce a entrar no autocarro errado, esta manhã? A senhorita está nisto para o engate ou pelas receitas caseiras? O que tira o sono à dona do gato? A que saberá o beijo da pirata?
segunda-feira, 26 de junho de 2017
quinta-feira, 22 de junho de 2017
terça-feira, 20 de junho de 2017
De que cor é o teu céu?
Cruzamo-nos e detemo-nos. Sorrimos. Cumprimentamo-nos com palavras banais. Trocamos dois dedos de conversa do quotidiano. Despedimo-nos com beijos. Olhamos para trás a acenar. Há anos que não a via.
Eu vou para os Anjos. Ela, não sei.
Um golo de café
-"É impossível ir por aí! Sem caminhos abertos, o corpo não passa."
Então, as mãos fizeram-se sonho e o homem voou.
Então, as mãos fizeram-se sonho e o homem voou.
segunda-feira, 19 de junho de 2017
Desintoxicar com leite
Não sei se o centro de Portugal é o seu coração. Sei que está ferido o centro de Portugal. Sei que está ferido o meu coração. E dói-me - provinciano me confesso - com a devastação que as desgraças longínquas não igualam.
sexta-feira, 16 de junho de 2017
Isto ainda vai acabar bem
Importa-me pouco se a viagem acaba ou não, se recomeça ou se se repete. Haverá sempre mais para ver, e isso basta-me. Sou dos que não quer viver muito, apenas o suficiente. Dizerem-me que a morte é certa é como eu dizer à minha filha que Hogwarts não existe. Só pessoas que exclamam "olha, um urso polar albino" quando vêem um urso preto, dizem coisas daquelas. É gente que nem sonha que até a música se solta de si em busca do sol.
Tenho a certeza de que, quando chegar a minha hora, saberei ir à minha vida!
quinta-feira, 15 de junho de 2017
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