Durante muitos anos, a 5ª feira da Ascensão e o dia de bolinhos foram os meus feriados preferidos. Era sabido que nos juntaríamos todos na Herdade. Para cima de uma dezena de primos, várias tias e os avós. Os pais chegariam só para o fim de semana, o que nos dava uma sensação de liberdade vertiginosa. Bem cedo, íamos para a zona das pinheiras mansas e percorríamos os caminhos que, chegado o Verão, calcorrearíamos à cata de pinhões. Desta feita, porém, procurávamos tulipas "galo, galinha ou pinto" e ervas ásperas que atirávamos às roupas de uns e de outros, em punhados, gritando "quantos namorados tens". O avô acompanhava estas expedições e, com ele, aprendemos todos a cantar "minhas botas velhas, cardadas". Havia, também, a das velhas desdentadas e carecas, que nos fazia rir sempre que chegávamos à parte do velho pançudo que soprava por um canudo. Colecionávamos chapéus de cobra, malmequeres desfolhados, braçadas de rosmaninho e de alfazema e, claro, espigas. Íamos colhendo sem grande critério e só não apanhávamos exemplares das que o avô avisava "essas não". No regresso, era cumprido o ritual de colocarmos tudo num monte, sentando-nos em seu redor, enquanto cada um ia compondo o ramo da espiga que, depois de preso com o caule de uma erva, ofereceria à sua mãe. O avô fazia sempre o ramo da casa. Lembro-me de que, à chegada, nos esperava limonada adoçada com açúcar louro, refresco de vinagre, cevada fraquinha e broas acabadas de cozer, regadas com azeite e polvilhadas de açúcar. Então, o avô entregava o seu ramo à avó, que o pendurava na parede da alpendrada.
... Talvez este ainda seja um daqueles anos... com rituais de ice tea.
Descrição povoado de sabores, de cores e tradições que vale a pena continuar. Broa com açúcar...é, talvez, a mais carregada de emoção, para mim. Feliz dia, já quase noite, Outro Ente.
ResponderEliminarUm beijo,
Mia
Só me lembrei do dia da espiga quando passei pelas vendedoras de ramos na Praça de Londres, mas hoje ao jantar fiz questão de explicar o que cada flor significava.
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