domingo, 28 de junho de 2015

Parergas e Paralipomenas, os outros podem esperar

Será o orgulho um vício ou uma virtude? O único dicionário que vale a pena é o de Voltaire. O almejar de uma sociedade melhor implica, necessariamente, a igualdade absoluta? Assim se constrói a Torre de Babel ou a queda de Ícaro? A união erradicará o desigual ou tratá-lo-á como igual? Temos todos os mesmos sonhos? Amamos uniformemente a Vista de Delft? A integração económica é demasiada ou insuficiente? Esquecemos o entrosamento social? Este é indispensável ou impossível? Ou será indesejável para alguns, como uma música dodecafónica? Vejo-me grego.
Bem sei que a forma de evitar que a criança caia ou se afaste é levá-la às cavalitas. Contudo, ficará também impedida de correr atrás dos pombos. Porque é o meu destino mais importante do que o seu chafariz? Acudi, sobrinho de Rameau. A cegueira é um vício? Qual o seu reverso? Alexandre Bogdanov e sua Proletkult resolviam-no? Assim, entraremos em ciclos viciosos conducentes a non liquet? Será esse nada uma forma de preguiça? Vejo-me grego.
Sem respostas, mantenho, porém, a desconfiança perante os que, de olhos postos num objetivo e alheios ao percurso, falam para baixo, abanando a cabeça após cada ditame, com audível fecho de epiglote marcando pontos finais que parecem não acabar.   
Ainda que se vivam períodos intermédios da história, equiparáveis aos do Antigo Egito, para les uns, as férias são en Provence...

10 comentários:

  1. Respostas
    1. Querida Luísa,
      Para ser menos cínico, poderia citar Todorov, em Nous et les Autres: "le meilleur régime du monde n'est jamais que le moins mauvais, et, même si l'on y vit, tout reste encore à faire. Apprendre à vivre avec les autres fait partie de cette sagesse-là".
      Um beijo,
      Outro Ente.

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  2. Creio que varia de acordo com as circunstâncias e ainda com as interpretações. Não é um conceito estanque isso do orgulho. Pode ser benfazejo ou malfazejo. É difícil definir. Quase tão difícil como definir "uma sociedade melhor". Talvez não tão difícil como alcançá-la.
    Pode o orgulho representar a integridade, a retidão de quem não verga perante a ignomínia. Ou pode o orgulho, ser só, estúpido orgulho.
    Pois que também me vejo grega, Outro Ente. E se dissesse, vejo-me portuguesa, deturpava a expressão, mas, não sei se concorda comigo, também não ficava mal.
    Gosto tanto destes seus textos. Já apontei aqui uma série de referências, para, assim que possa, ver se aprendo mais umas coisas e assim conseguir percebê-lo, ao texto, em toda a sua plenitude.
    Boa noite, Outro Ente.

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    1. Querida Cláudia,
      Quase tudo o que é encerra em si o não ser. A virtude e a perdição podem juntar-se num mesmo conceito. Ou então, servirá apenas de pretexto para não ser o que é.
      Entretanto, retenho que gosta mais de mim (a presunção) quando menos me compreende. Eu, por vezes, também.
      Bom dia,
      Outro Ente.

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    2. Gosto de acreditar que, tal como neste seu post, aqui, o essencial é visível aos olhos, apesar disto serem "só blogs". A si (presunção) acho que compreendo. Falta-me aprofundar o conhecimento das ideias de alguns senhores mencionados.
      Boa tarde, Outro Ente.

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    3. Percebo que também gosta de filosofia. Mas, apesar da banalidade em que caiu e lhe retirou o élan, "o essencial é invisível aos olhos".
      Boa noite,
      Outro Ente.

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    4. Não concordo consigo. Acho que as pessoas deixam escapar muito do que são, naquilo que escrevem e na forma como interagem. Mesmo as que aparecem blindadas por bonecos, ou personagens, se quiser. Não são raras as vezes em que os criadores se sobrepõem às criaturas, não são raras as vezes em que os criadores esquecem as criaturas e falam por si, isto na escrita a longo prazo, claro, não falo de obras literárias. Essa expressão, como bem sabe, significa que os olhos se distraem muito pelo caminho, até atingirem a essência de alguma coisa. Se é que de tão distraídos que ficam, conseguem atingir a essência de alguma coisa, de tão distraídos com o tanto que as aparências distraem. É por isso que digo, que em determinados contextos, talvez, o essencial seja o mais visível (o talvez, sou eu a conceder, mas um bocado contrariada). Ou então, como eu sou como escrevo, estou a incorrer no erro crasso de avaliar as outras pessoas pela própria experiência. Ou posso fazer-lhe a vontade a si e ir para um campo muito mais difícil, filosofar e dizer que a verdadeira essência das coisas nunca se atinge, nunca se conhece e portanto, nem a nossa própria essência nós conhecemos. Invisível portanto, ou, imperceptível.
      Boa noite.

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    5. "Só se vê bem com o coração, o essencial é invisível aos olhos".
      Depois não diga que não tentei poupá-la ao tédio:
      Eu não sei que a expressão “significa que os olhos se distraem muito pelo caminho, até atingirem a essência de alguma coisa”. Aliás, entendo que tem significado diverso. Vejamos:
      Reduzir o significado da expressão ao entendimento de que a aparência não revela a totalidade do ser, havendo que descortinar o que está escondido ou, pelo menos, velado, parece demasiado simplista para o pensamento subjacente.
      Penso que, em causa, estarão as teorias existencialistas e as essencialistas, que distinguem entre conhecimento intelectual e conhecimento sensível.
      Assim, teríamos o essencialismo, centrado nos sentidos que nos põem em contacto com os seres particulares e contingentes, que serão os únicos que existem na realidade; e o existencialismo que se centra na inteligência através da qual aprendemos as ideias ou essências, géneros e espécies universais, meras possibilidades de ser, em si mesmas inexistentes.
      Note-se que Sócrates definiu o objeto da ciência como o universal, tendo Platão tentado resolver a contradição hipostasiando as ideias e Aristóteles criticado essa teoria platónica das ideias, pressupondo o hilomorfismo, ou teoria do ser entendido como existente, feito de matéria e de forma.
      Os essencialistas como Aristóteles, Descartes e Kant afirmam a existência de um núcleo ideal necessário e universal da realidade factual.
      Em suma, diria que os essencialistas tentam conhecer o que é o ente, enquanto que os existencialistas procuram compreender como é o ente.
      Tendo os essencialistas como uma espécie de druidas de um deus humano, considero que importará atender ao existencialismo que pretende uma valorização do Homem, ser concreto com circunstâncias, viver easpirações totais(o "Dasein" para Heidegger ou a "Existenz" para Jaspers).
      Assim, e em resumo, “o que se escreve e a forma como se interage”, a que alude, será, de facto, invisível para os olhos, na medida em que apenas através da inteligência será alcançável e apreciável. Atingir essa essência alheia será apreender o outro encarado sob a perspetiva existencialista. O invisível não equivale, pelo menos neste contexto, ao imperceptível.
      Quanto ao desconhecimento da própria essência, dir-lhe-ei apenas (que isto já vai demasiado longo e, há muito, abuso da sua paciência) como tal é, amiúde, uma benção, na medida em que muitos são piores do que se julgam.
      Finalmente, será demasiado arrogante presumir que sempre concordou comigo?
      Um beijo,
      Outro Ente.

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    6. Ontem, depois de ter escrito o comentário, tive a perceção de que estava a ir por uma via fácil e apesar da hora, saí daqui e fiz uma pergunta ao Google e a pergunta encaminhou-me para uma explicação sobre o verdadeiro significado dessa expressão. Lá estava, a referência às correntes de pensamento essencialista e existencialista. Percebi que o que tinha comentado era um disparate, que não tinha nada a ver com o verdadeiro significado da expressão "o essencial é invisível aos olhos".
      Quando me respondeu e disse, que percebia que eu também gostava de filosofia, respondo-lhe agora que, do que eu gosto mesmo muito é de pensar e gosto mesmo muito de quem me ajuda, ou colabora comigo, no que considero uma arte, a arte de pensar. Andava a fazer uma interpretação incorreta, da forma mais óbvia e simplista, na precipitação de quem fala sem saber do que está a falar. Não estava à espera que tivesse a enorme generosidade de perder o seu tempo a explicar-me e desta forma, inatingível para qualquer motor de busca, que o que eu tinha escrito estava errado e jamais me atreveria a pedir-lhe esta explicação, (mas, secretamente, desejei muito que acontecesse).
      "...será demasiado arrogante presumir que sempre concordou comigo?" não, não é "demasiado arrogante", é mais uma vez, isso sim, demasiado generoso da sua parte e para além de generoso, elegante. Não concordei sempre consigo, porque o meu estado de ignorância em relação ao assunto, quando comentei, não permitia, agora sim, concordo totalmente consigo.
      Agradeço-lhe tanto a capacidade para me encarar sob a perspectiva existencialista e assim ter dado a explicação que tanto desejei (sorriso).
      Sinta-se completamente à vontade para "abusar da minha paciência", desta forma, as vezes que quiser.
      Estou neste momento tão contente consigo que lhe deixo um abraço e dos fortes.
      Muito obrigada, Outro Ente.

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    7. Foi um gosto.
      Um beijo,
      Outro Ente.

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