A história que vos vou contar foi-me contada vezes sem conta. E passou-se assim, exatamente assim, como sempre me contaram:
Há muitos, muitos anos, o meu bisavô era um homem possante e Eliza a sua amada mulher franzina. Naquele dia, ele saiu bem cedo para a cidade, tratar de negócios e levantar dinheiros para pagar aos trabalhadores. Era Verão e o sol estava quase no pico quando disseram a Eliza que uns malfeitores esperavam o marido. Iam fazer-lhe uma emboscada para o aliviarem da bolsa. Então, Eliza pegou numa caçadeira, montou "à homem" numa das éguas e galopou em direção às terras d'além. Ao avistar três homens barbudos, vociferou que se não debandassem lhes enchia o bandulho de chumbo "tão certo como estilhaçar aquela telha que está de lado". E, empunhando a arma, disparou à telha que descaía da empena do casebre, desfazendo-a. Receosos, os malfeitores fugiram e o bisavô chegou à herdade são e salvo.
Eliza sempre foi comentada como excêntrica pelas mulheres...
Talvez o dia da mulher não te diga nada. Talvez penses que não precisas dele. Talvez até te sintas diminuída por haver um dia da mulher. Eliza não desdenharia deste dia.
Eliza tinha uma grande pontaria. Uma telha é uma coisinha minúscula. Eu nem sequer veria a telha se vivesse nos tempos da Eliza, porque pura e simplesmente não haveria de ter dinheiro para uns óculos compatíveis com a minha miopia.
ResponderEliminarSobre a temática tenho a dizer que o dia da mulher, e no caso exposto, foi o 'dia em que a mulher', o que faz toda a diferença. Vários dias 'em que a mulher' fez isto e aquilo transformaram-se no dia 'da' mulher, o que é parvo, porque a mulher vem fazendo desde que existe.
Querida Uva Passa,
EliminarÉ fundacional: "a mulher vem fazendo desde que existe".
(Parece-me que a razão para o dia 8 de Março ser dia da mulher não é bem o agregar de vários dias em que a mulher fez. Mas isso serão apenas histórias.)
Bom dia,
Outro Ente.
A razão é uma fábrica, onde várias mulheres 'faziam', ter ardido e levado com ela 153. Não é um absurdo. O dia da mulher para assinalar a morte de 153 mulheres.
EliminarNão é um absurdo? Era uma pergunta.
EliminarParece-me que o dia da mulher comemora-se a 8 de Março por causa da data em que ocorre a tragédia que descreve. Não se limita, porém, a "assinalar" tal facto. Antes, pretende afirmar os direitos das mulheres como direitos humanos fundamentais e contribuir para a evolução no sentido da igualdade de género. A consciencialização quanto à igualdade e o repúdio da descriminação são, a meu ver, os princípios dominantes que escoram a existência deste "dia da mulher" e - uma vez mais a meu ver - são o oposto de absurdo. Aliás, não estivéssemos apenas "nisto dos blogs", com a sua ligeireza inata, e a argumentação de que o dia da mulher se limita a assinalar a data da morte de centena e meia de mártires poderia ser tida como insidiosa, a roçar a desonestidade intelectual.
EliminarSubjacente ao dia da mulher está a ideologia que pretende ver ultrapassada a subjugação das mulheres.
As mulheres estavam a manifestar-se e foram encerradas dentro da fábrica à que foi incendiada. Foram assassinadas por estarem a manifestar-se contra as suas condições de trabalho. Não, não é parvo escolher este dia.
EliminarA banalização do dia de tudo e mais alguma coisa é que lhe retira algum sentido.
Querida Cuca, a Pirata,
EliminarHá princípios com dignidade fundamental intrínseca. Por exemplo, a igualdade radical entre seres humanos e a inviolabilidade da vida humana. Claro que os dias serão o que fizermos deles. O dia da mulher pode servir de pretexto para pedinchar uma joia ou ser tema de um trabalho interessante apresentado numa das meritórias iniciativas que hoje tiveram lugar. De parvo não tem nada.
Um beijo,
Outro Ente.
Eliza não desdenharia do dia mas com que olhos veria Eliza algumas iniciativas comemorativas em que as mulheres se diminuem duma forma assustadora?
ResponderEliminarQuerida Be,
EliminarDe acordo com Uva Passa, veria sem óculos.
(Desconheço a que iniciativas se refere, pelo que não posso sequer opinar em nome próprio.)
Beijos,
Outro Ente.
Elizateve consigo um grande homem que a ensinou a montar e disparar.
ResponderEliminarNão conheci o trisavô alemão.
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